17 de abril de 2008

Um corpo que cai


A polícia vai indiciar Alexandre e Ana Jatobá pelo assassinato de Isabella.


Nesta sexta-feira, ela completaria 6 anos.


Vai ser um dia de muito sofrimento.

Quem sabe, uma catarse coletiva nos libere destas amarras que nos prendem a esta tragédia.


A data também tem sentido simbólico para a polícia e todos os envolvidos que querem resolver tudo até este dia.


E há muito para resolver, esclarecer, aprender, em toda esta tragédia, inclusive, para o público.


Há coisas muito tristes na reação do nosso povo neste caso doloroso.


A primeira é a busca selvagem e apressada por justiça, que inclui ítens bárbaros como o pré-julgamento ansioso e a pré-condenação sem provas. Mas isso, todos já comentamos.

A segunda, chega a ser chocante e mostra como o egoísmo pode superar a compaixão com facilidade: tem gente feliz porque acha que 'acertou' o palpite sobre os culpados, como se um crime fosse um game show de televisão ou um bilhete de loteria. A pessoa mal consegue lamentar a estupidez feita com a criança porque está 'celebrando' o fato de perceber-se certa em suas suposições sobre os criminosos. Comemorar a vitória de um mero palpite diante de uma vida perdida é um traço sério de crueldade.


A terceira, que é o grande mistério é a componente de perversidade que há em todos nós. O que os números mostraram é que, a curto prazo, nos números de audiência, a canalhece venceu a ética e que, em vários casos, o bom jornalismo perdeu para o sensacionalismo barato. A 'massa' prestigia a baixaria. Entre elas, há quem acredite que ser fiel à ética é 'papo de perdedor' e que o que vale é perseguir a audiência a qualquer preço.

Para que a breve vida desta menina que tanto nos comoveu possa se perpetuar na nossa, deixando um legado de humanidade e amor é preciso arrancar algum aprendizado deste crime horrível.


Devemos todos olhar para nossos próprios umbigos e, sem medo, encarar as gotas de sangue que respingaram também em nós.


Na solidão da nossa consciência é preciso ver que nós, como muitos dos envolvidos, também mentimos. Dizemos que 'estamos fartos deste caso' e voltamos para consumir mais e mais informações sobre ele.


Dizemos que 'não queremos sensacionalismo barato', mas carimbamos o passaporte da baixaria prestigiando suas bizarras transmissões.

Não é crime ser um espectador fantasioso e, o fato de inventarmos histórias envolvendo mães, pais, parentes, para chegar ao assassino da menina não nos transforma em monstros hediondos. Somos humanos finitos sempre exercitando o medo e a aceitação da morte. Mas, como adultos e cidadãos é preciso ter mais sensatez e respeito.


De tudo, ficam a dor, a tristeza, a comoção, pela menina, por sua mãe, por seus avós, por todos.


E a nossa dor advinda das rachaduras profundas hoje presentes nos pilares de nossa fé, no amor mais estrutural, o de pais e filhos, o de adultos e crianças.


Não se pode olhar a bizarrice oportunista e canalha como se fosse jornalismo.

Da mesma forma que não se pode olhar um filho morto em seus braços e ver ali, um corpo a ser jogado pela janela.


Jerry Alves
Jornalista, radialista, mestre de cerimônias e escritor.


Fonte: Blog do Jerry Alves

Nenhum comentário:

Postar um comentário